
Uma das perguntas mais comuns em pesquisas é a intenção de compra. Todos os tipos de testes a utilizam, como um dos indicadores de sucesso, de testes de formulações a embalagens. Estas perguntas (junto com avaliação global e outras) são bastante úteis para comparação entre os estímulos em teste. Por exemplo, quando testamos alguns produtos. Aquele que tem índices significativamente superiores nestes indicadores, é normalmente indicado como o mais bem sucedido no teste.
O que sempre falo, entretanto, é que a intenção de compra não deve ser usada indiscriminadamente como um indicador de vendas futuras. Há até alguns cálculos para esta conversão (1). E estudos mostrando quando esse indicador é mais ou menos válido (2). Mas há muitas outras variáveis que interferem, antes que a intenção se converta em uma ação de compra (3). E a influência destes varia de acordo com a categoria e a marca. Alguns deles as empresas controlam diretamente, tais como distribuição, qualidade do produto ou serviço, preço, investimento publicitário e plano de mídia. Outros, são fatores sobre os quais as empresas têm controle parcial: equity da marca, boca a boca, mídias sociais, percepção de valor e de qualidade, comportamento do consumidor, entre outros.
Entretanto, um dos fatores sobre os quais as empresas têm controle é a maneira como os dados que orientam as suas ações são obtidos. Quando fazemos perguntas diretas em pesquisas, normalmente os respondentes fazem uma elaboração mental. Usam para isto, o sistema racional e consciente (o sistema 2). Mas, mesmo assim, há diversos elementos não conscientes em jogo, que podem levar a vieses de resposta, e que podem ser controlados na pesquisa.
Por exemplo, o efeito halo faz com que uma avaliação geral positiva influencie respostas sobre atributos específicos, e vice-versa. A ilusão de foco nos dá a impressão de que algo é mais importante do que normalmente consideramos, por estarmos focados naquilo (os estímulos da pesquisa). O mero fato de o questionário repetir um estímulo pode dar a ele mais peso (efeito da exposição simples). Estes fatores certamente influenciam as respostas a um questionário. Eles levam a super ou subestimação de intenção de compra, pois muitos deles não estarão presentes no momento da compra real.
Para tornar a coisa mais complexa ainda, existe o momento da compra, muito diferente do momento da pesquisa. Este pode ser um momento quente, em que estamos com alguma necessidade premente (tal como fome ou pressa). Isto influencia determinantemente a decisão. Mais do que isto, podemos estar comprando diversos itens (se estamos falando de bens massivos). É impossível que cada um deles tenha a mesma atenção que teve no momento da pesquisa. E aí entra em ação o sistema 1, automático. E então as heurísticas (atalhos mentais entram em ação). Inúmeros deles podem interferir numa mesma compra, tais como o viés da unidade, efeitos de primazia e recência, efeito da mera exposição, só para citar alguns.
As marcas podem também interferir com o momento da verdade, e se beneficiar de algumas heurísticas e nudges. Podem, por exemplo, interromper o automatismo, oferecendo algum elemento novo bastante saliente (promoções, materiais de PDV, e muitos outros exemplos). Podem simplificar a compra, para evitar efeitos como o paradoxo da escolha, dado por excesso de opções. Ou eliminar etapas desnecessárias no processo de compra (sludge (4)), tais como cadastros desnecessários, vendas casadas, garantia estendidas antes de a compra estar fechada, etc.
Resumindo, são muito os elementos que levam ao fechamento de uma compra. Entre a intenção e a ação há um caminho grande. É necessário entender esse caminho completo da melhor maneira possível. E não há fórmula mágica para isto, a não ser dados bem coletados, perguntas bem formuladas e resultados bem analisados. De preferência, agregando o conhecimento da ciência comportamental.
- William J. Infosino, Forecasting New Product Sales from Likelihood of Purchase Ratings. Marketing Science (1986)
- Vicki G. Morwitz Joel H. Steckel Alok Gupta* When Do Purchase Intentions Predict Sales? New York University Revised, July 12, 2006
- Lusk, J.L., McLaughlin, L. & Jaeger, S.R. Strategy and response to purchase intention questions. Market Lett (2007).
- Constantinos K. Coursaris; Wietske Van Osch; Brigitte A. Balogh Do Facebook Likes Lead to Shares or Sales? Exploring the Empirical Links between Social Media Content, Brand Equity, Purchase Intention, and Engagement. 2016 49th Hawaii International Conference on System Sciences (HICSS)
- Chang, TZ., Wildt, A.R. Price, product information, and purchase intention: An empirical study. JAMS 22, 16–27 (1994).
- Thaler, R. H. (2018). Nudge, not sludge. Science.