Já alertei para o risco de discussões em grupo serem influenciadas por fenômenos como o efeito manada e a ignorância pluralística (1), bem como outros mecanismos de influência social. Hoje quero discutir um estudo muito contundente, sobre como um indivíduo pode alterar radicalmente a opinião de um grupo.
Este foi um estudo feito por Matthew Salganik e seus coautores, citado por Kahneman e coautores (2). Seu objetivo era entender se influências sociais poderiam afetar as escolhas musicais das pessoas. Ou seja, se músicas poderiam se tornar mais ou menos populares, dependendo das escolhas que outras pessoas faziam.
Eles criaram um grupo controle e vários grupos tratamento, todos com milhares de pessoas. Elas podiam ouvir e baixar quantas músicas desejassem, de uma seleção de setenta e duas músicas. No grupo controle, os participantes não tinham acesso às escolhas dos demais. Ou seja, não sabiam quais eram as músicas mais populares. Os grupos tratamento eram idênticos, com apenas uma exceção: as pessoas podiam ver quantas pessoas em seu grupo haviam baixado cada música.
A principal descoberta foi que a popularidade das músicas dependia de quantas vezes ela tinha sido baixada inicialmente. O ranking de dowloads foi muito diferente entre os grupos tratamento, e entre os grupos controle e tratamento. E, dentro de cada grupo, a popularidade sempre dependia de quais músicas eram baixadas em primeiro lugar.
Agora imagine uma discussão em grupo: a primeira pessoa a falar no grupo tem uma opinião favorável à marca em estudo. Esta simples opinião pode fazer com que os demais passem a falar favoravelmente à marca, ou se omitam ou atenuem uma eventual opinião negativa. O contrário pode acontecer, caso alguém que tem uma experiencia negativa com a marca fale em primeiro lugar. Os demais podem se sentir inibidos, e não expressarem opiniões positivas, ou até mudar a opinião ao verbalizá-la.
Para efeitos de pesquisa mercadológica, fica claro que temos um problema nas DGs: podemos estar chegando a conclusões radicalmente diferentes, em grupos demográfica e mercadologicamente idênticos, dependendo da eloquência, ceticismo ou criticismo de quem participa do grupo!
Ademais, muito se fala que a DG visa entender a interação grupal. Ora, em condições normais, ninguém faz compras em grupo. Muito menos participa de uma discussão em grupo antes de decidir que produto ou serviço consumir. Adicionalmente, mesmo que desejemos entender a interação grupal, nunca saberemos, no grupo apenas, o que é opinião individual e o que foi influenciado pela opinião alheia.
Como evitar isso? Sugerimos fortemente trabalhar com entrevistas individuais em profundidade. Mesmo nas EPs, empregamos técnicas projetivas e laddering, além de neuro marketing, para fugir das racionalizações.
Caso, ainda assim, haja interesse em discussões em grupo, estas devem sempre ser precedidas de diários, observações e questionários individuais. E, certamente, recorrer às mesmas técnicas que recomendamos nas EPs. Em ambos os casos, também usamos técnicas de análise de discurso na interpretação. Além, de obviamente, frames analíticos de ciência comportamental.
2. Noise: A Flaw in Human Judgment (English Edition) por Daniel Kahneman, Olivier Sibony, Cass R. Sunstein