Arquitetura do Comportamento

Como aterrissamos a ciência comportamental para aplicação prática em negócios?

Tenho falado bastante de heurísticas e vieses, como eles nos ajudam a entender os consumidores, e, também, de maneiras de evitá-los no momento de coletar informações. Hoje quero falar de outro ponto importante: como analisar os dados usando modelos comportamentais.

O primeiro esclarecimento é que estes não são modelos estatísticos. São modelos analíticos. Por isso, tenho preferido chamá-los de frames analíticos comportamentais, com o perdão do anglicismo. Existe muita literatura sobre o tema. Um dos livros disponíveis lista mais de 80 frames (1). Cada um deles tem suas aplicações mais recomendadas – saúde pública, finanças, direito, marketing, etc. O que mais me inspirou foi a Behaviour Change Wheel (2), que é uma aplicação de alguns destes frames, tendo como centro o frame chamado COM-B. Tenho usado muito também o trabalho de um professor da Universidade Northwestern, Alexander Chernev.

Como funciona um frame destes? Ele parte do princípio de que desejamos influenciar o comportamento das pessoas. Em qualquer área, incluindo marketing e vendas. Desejamos convencer as pessoas que nosso produto é melhor que o concorrente. Convencê-las de que vale a pena comprar mais quantidade e com mais frequência. De que vale a pena começar a usar uma categoria que ainda não usam. Em todos estes casos, queremos persuadir o consumidor para uma mudança nos seus comportamentos de consumo.

Em todos os frames, a premissa é de que para mudar o comportamento, algumas condições são necessárias. Vamos usar o COM-B, como exemplo. Nele, uma mudança de comportamento (B, de Behaviour, comportamento em inglês) exige Capacidade (C), Oportunidade (O) e Motivação (M). Os dados, que podem vir de pesquisas ou outras fontes, nos dirão quais são as barreiras à mudança de comportamento em cada uma dessas 3 áreas (C, O e M). Uma vez identificadas as barreiras, são sugeridas intervenções para superá-las. As intervenções podem ser propaganda, promoção, influência, autoridade, material de PDV, ou outras já conhecidas pelo pessoal de marketing. Nos próximos parágrafos, explico, de maneira simplificada e esquemática, como seria a aplicação do COM-B a um problema real de consumo.

O problema comportamental hipotético será: como estimular consumidores do sexo masculino a usarem protetor solar facil. O comportamento (B, na sigla COM-B) desejado é aplicar o produto com regularidade.  

Aplicando o modelo, em (C – capacidade), podemos verificar que lhes falta conhecimento sobre os benefícios de usar o produto. As intervenções, para superar estas barreiras, podem ser iniciativas de orientação sobre as consequências de não usar a categoria, e qual o uso adequado.

No (O – oportunidade), lhes falta o hábito, o costume cotidiano de aplicar o protetor– por falta de tempo, por exemplo. A recomendação de intervenção é promover lembretes nos momentos quentes de uso, por exemplo, logo após fazer a barba, ou lavar o rosto, para facilitar a introdução do comportamento no cotidiano.  

E no (M – motivação), ainda falando em hipótese, falta ao público de interesse a percepção de relevância, e sobre a eficácia de aplicar protetor no rosto. Para isto, podemos ativar a motivação através de modelos (pessoas que podem influenciar o seu comportamento). Neste caso, poderíamos trabalhar com dois tipos de modelos. Primeiramente, profissionais especializados (por exemplo, médicos dermatologistas), falando da importância do uso – dando-lhe relevância. E, em segundo lugar, usando exemplos de pessoas comuns, demonstrando como mudaram a aparência e saúde da pele usando protetor com regularidade.

Esta é uma explicação muito simplificada, no espaço de um artigo, de como aplicamos os frames analíticos. A ideia, sempre, é entender o consumidor, observar os gatilhos e barreiras à mudança de comportamento, e propor intervenções, através de técnicas de marketing, para influenciar o seu comportamento.

1 ABC Of Behaviour Change Theories (Behavior Change): An Essential Resource for Researchers, Policy Makers and Practitioners (English Edition)” por Susan Michie, Robert West, Rona Campbell, Jamie Brown, Heather Gainforth.

2 The Behaviour Change Wheel – a Guide to Designing Interventions. Michie, S; Atkins, L & West, R, 2014

Leave a Reply

Your email address will not be published. Required fields are marked *