
Sabemos que escolhemos baseados em pontos de referência. O contexto importa muito, portanto, assim como os estímulos do ambiente. Experimentos mostram que qualquer número, mesmo aleatório, pode funcionar como parâmetro para a decisão. Por exemplo, os organizadores de um experimento giravam uma roleta e os participantes viam o número sorteado. Eles deviam, em seguida, dizer qual porcentagem dos países africanos pertencia à ONU. O Grupo A, que viu o número 10 na roleta, chutava em média 25%. O Grupo B, que viu o número 65, dizia que em média 45% desses países eram membros (1). Outro experimento famoso mostra a influência dos dígitos finais do número do documento de identidade. Após escreverem os dois últimos números da sua identidade, as pessoas respondiam quando desejavam pagar por diversos itens. Quando mais altos os dígitos, mais alto o preço que os indivíduos estavam dispostos a pagar (2).
Por isso, em compras de produtos e serviços, todos nós somos sujeitos a este efeito, chamado ancoragem. O número que a pessoa vê em primeiro lugar acaba sendo aquele que serve de referência. Por exemplo, em um cardápio de restaurante. O primeiro item na lista será a referência. Por isso, especialistas em construção de cardápios procuram encabeçar a lista, e destacar (framing), itens mais caros. Depois destes itens, a maioria dos demais vai parecer ter um preço razoável.
Da mesma maneira, em pacotes de serviços. Sempre é interessante ter um pacote mais do que completo como ancora, e pacotes quase tão bons quando a preços mais baixos. Normalmente o pacote completo é oferecido acima do seu preço real, para que sirva como âncora e como chamariz (decoy effect), para orientar a compra aos pacotes mais baratos.
Em vendas de bens de consumo massivos, a ancoragem também pode ser utilizada na montagem da estratégia de preços e quantidade comprada. Um experimento junto a um supermercado demonstra isto (3). Uma promoção oferecia 15% de desconto numa marca de cerveja. Em alguns dias, não havia limite de unidades que cada pessoa podia comprar. Em outros dias, o limite foi de 12 unidades por pessoa. Ainda que contraintuitivamente, a quantidade comprada foi o dobro nos dias que havia o limite. As 12 unidades funcionavam como âncora à escolha. Além de sinalizarem uma potencial escassez do produto, outro princípio impulsionador da escolha.
(1) Tversky and Kahneman. Judgment under Uncertainty: Heuristics and Biases: Biases in judgments reveal some heuristics of thinking under uncertainty. 1974
(2) Ariely, Dan. Predictably Irrational: The Hidden Forces That Shape Our Decisions, Revised and Expanded Edition. HarperCollins, 2010. (3) Kahneman, D. Thinking, Fast and Slow.
(3) Kahneman, D. Thinking, Fast and Slow. 2011